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Com a Nutricionista Maiara Fidalgo: Como Driblar a Cultura da Dieta e Food Shaming

  • Foto do escritor: BADDU
    BADDU
  • 18 de abr. de 2021
  • 6 min de leitura

 



Cultura da dieta e food shaming são casos interligados, que parecem estar ainda mais próximos atualmente, por conta de pressões estéticas impostas pela sociedade.


Nessa entrevista, conversamos com a nutricionista Maiara Fidalgo. Ela nos explicou mais sobre esses conceitos e como eles são prejudiciais para o emocional e psicológico das pessoas.


 


 

Baddu

1. O que é cultura da dieta?

Maiara

A cultura da dieta envolve a pressão estática dos padrões irreais de beleza, que alimenta uma indústria em um mercado muito lucrativo, tanto de remédio para emagrecer, quanto de cirurgias plásticas e cirurgias bariátricas, bem como programas de emagrecimento. Tudo isso, dentro de uma sociedade que acaba naturalizando essa busca por um corpo ideal. Essa é uma cultura que acaba estigmatizando corpos que não estão dentro do padrão.


Corpos gordos são colocados como corpos doentes. É uma cultura que acaba alimentando a gordofobia. Isso influencia na percepção das pessoas do seu próprio valor, da sua autoestima e da sua auto imagem, gerando consequências bem desafiadoras para a saúde mental e saúde emocional.

Baddu

2. O que é food shaming?

Maiara

O food shaming é envergonhar alguém pelo o que a pessoa está comendo. Essa vergonha através da comida vem muito relacionada à críticas com relação ao valor nutricional de determinados alimentos.


Então, é como se o que o outro come fosse público e plausível de comentários.

Por exemplo, eu escolhi comer determinado alimento no restaurante e alguém comentou sobre meu prato: “Nossa isso é muito calórico. Você não deveria comer isso. Isso faz mal, isso engorda.” Ou seja, é colocar uma carga moral nas refeições.


Essa questão do food shaming está muito relacionada a uma visão dicotômica dos alimentos, como se existissem alimentos bons, devido ao alto teor nutricional, e alimentos ruins, de acordo com o teor nutricional.


Dentro da abordagem que eu trabalho, que é alimentação intuitiva e consciente, o que a gente tenta sempre trazer é não que tem alimento “bom” e “ruim”. Tudo vai depender do contexto, da frequência e da dosagem com que o alimento é consumido.


Já essa visão da cultura da dieta e do food shaming não analisa o contexto, frequência e quantidade. Também é importante contestarmos essas coisas, porque o prato do outro não é público, assim como o corpo do outro não é público. Portanto, esses comentários devem ser evitados pela saúde mental e saúde emocional das pessoas.


Acontece que muitas vezes as várias múltiplas funções dos alimentos acabam sendo desconsideradas. Por isso, esse terrorismo nutricional fica muito evidente no food shaming, que gera um controle em relação a calorias e nutrientes, alimentos saudáveis ou não saudáveis, sem muitas vezes entrar no processo de contextualizar e entender o que está por trás daquela escolha - que passa também por aspectos subjetivos de afeto e da cultura daquele alimento.

Baddu

3. Como as duas se relacionam?

Maiara

A cultura da dieta acaba alimentando o food shaming a partir do momento em que a pressão estética dos padrões de beleza usa uma máscara de “saúde”, impondo que o que você come afeta sua saúde física, sem considerar aquele comportamento como prejudicial para outros aspectos, como saúde mental.


Tanto a cultura da dieta, quanto o food shaming, acabam tendo essa conexão a partir do momento em que há um controle excessivo em relação aos corpos. Há uma busca excessiva pela alimentação perfeita e cada vez uma nova dieta é lançada, como low carb e jejum. Cada vez mais os alimentos são demonizados e colocados nesse lugar moral.


A partir do momento que eu preciso fazer um grande esforço na minha alimentação e eu tenho que evitar, me policiar e me restringir para ter determinado corpo, determinado peso ou estar dentro de uma norma vigente, eu acabo muitas vezes produzindo esses comentários que envergonham as pessoas ou até a mim mesma, me culpando e me julgando ao comer. Acabamos colocando essa moralização nos alimentos, muitas vezes sem perceber.

Baddu

4. Por que a cultura da dieta é prejudicial?

Maiara

Maiara: A cultura da dieta é muito prejudicial porque ela afasta os indivíduos de terem autonomia sobre os seus corpos. A cultura da dieta alimenta, muitas vezes, a rigidez e as regras externas do “tem que fazer de tal forma”. O controle excessivo acaba impossibilitando que as pessoas confiem nos seus próprios corpos e que entendam a diversidade de corpos como algo natural, e que não precisamos dessa busca por um único modelo.


Um padrão único de beleza gera sensações e sentimentos muito desconfortáveis, que acabam afetando a saúde mental das pessoas. Então, se constrói sentimentos de culpa, medo - de comer, de socializar e de se relacionar por conta do corpo -, e vergonha.


A cultura da dieta acaba alimentando também os transtornos alimentares, como anorexia, bulimia e compulsão alimentar. Então, em geral, um transtorno alimentar começa com uma dieta.

Baddu

5. Como se proteger diante da cultura da dieta e do food shaming?

Maiara

É importante trabalhar autoconhecimento. Perceber se essa cultura exerce um poder muito grande na sua vida, se acaba sugando muita energia da sua vida.


Em menor ou maior grau, somos afetados pela cultura da dieta, por que vivemos nessa sociedade, mas para mulheres isso acaba sendo muito mais reforçado do que, por exemplo, para homens. A cultura da dieta é muito mais presente e ativa no público feminino, por isso eu acho importante trabalhar o autoconhecimento e buscar ajuda, seja de um profissional nutricionista que trabalha com comportamento alimentar ou um psicólogo que também tem essa visão em relação ao corpo e comida.


Parar de seguir pessoas que têm um comportamento que reforcem a cultura da dieta nas redes sociais também pode ser uma forma de se proteger. Selecionar quais são as pessoas que você está consumindo conteúdo, parar de seguir blogueiras fitness e pessoas que acabam vendendo promessas milagrosas de emagrecimento ou que usam um excesso de exposição de corpos perfeitos é uma boa maneira de começar a se desprender dessa cultura.


Tudo isso pode estar afetando a sua relação com a comida, com o seu corpo e com a sua autoestima.


Também é importante trabalhar os seus limites. A partir do momento que você se sente invadida, que você sofre comentários de outras pessoas relacionados ao que você come e ao seu corpo, é importante - dentro do possível nesse processo terapêutico - expressar esse incômodo. Dizer coisas como “não quero que você comente o que eu como, isso me deixa mal e me faz sentir culpada” pode ser o primeiro passo para se libertar do food shaming e da cultura da dieta. Então, a gente também precisa estabelecer nossos limites para que essas invasões não aconteçam. Ou que pelo menos sejam minimizadas.

Baddu

6. Como a cultura da dieta afeta o psicológico e emocional das pessoas?

Maiara

Como eu já comentei, a cultura da dieta alimenta os transtornos alimentares e mantém o que a gente chama de “polícia da dieta”, que são críticas ativas sempre comentando e julgando o que está sendo consumido. Isso interfere muito na energia das pessoas, pois, em casos graves, é dificil conseguirem se dedicar a outras coisas que não seja esse controle excessivo do corpo e da comida.


Eu atendo muitas mulheres que mantém a vida em modo de espera, que deixam de se relacionar, deixam de ter prazer com os próprios corpos, com uma comida gostosa, deixam de ir pra praia, para uma piscina, tudo por conta da cultura da dieta.


O comer vira uma tortura, um sofrimento, e até mesmo um processo de punição.

Baddu

7. Há casos em que dieta é essencial? Se sim, quando?

Maiara

A dietoterapia na nutrição é importante em pacientes com doenças crônicas, como diabetes, hipercolesterolemia, doença renal crônica e hipertensão. Em alguns casos específicos, alguns ajustes na alimentação são importantes, mas é muito diferente da cultura da dieta.


Mesmo no atendimento a pacientes crônicos, a gente pode trabalhar de uma forma mais acolhedora, mais compassiva, sem ato de food shaming. Dizer para uma pessoa diabética “não pode comer isso, vai te matar, vai te fazer mal” é um terrorismo nutricional. Por isso, a forma com que a gente trabalha pode ser mas gentil e não precisa cair nesse lugar de envergonhar.


Vergonha não motiva ninguém, terrorismo não motiva ninguém. Pelo contrário: afasta os pacientes de buscarem ajuda com profissionais da saúde. Existem muitas pessoas que por conta dos estigmas de peso acabam deixando de buscar profissionais da saúde, porque se sentem julgados e humilhados.


Ou seja, é possível a gente trabalhar a dietoterapia, mas com uma abordagem mas acolhedora.

Baddu

8. Como você trabalha com seus clientes, para mudar a relação deles com a comida e dieta?

Maiara

Eu escolhi trabalhar com duas abordagens dentro do comportamento alimentar.


Eu trabalho com o comer intuitivo e o comer com atenção plena. Essas duas abordagens visam auxiliar o paciente a resgatar sua sabedoria corporal e a voltar a confiar nos sinais internos do corpo de fome, de saciedade e no processo de autorregulação. Eu sempre trabalhei de uma forma bem horizontal, proporcionando um ambiente que nutre a autonomia do paciente, e investigando os aspectos afetivos, culturais e sociais relacionados a comida.


A questão do comer emocional faz parte de processo terapêutico, pois eu consigo entender como vou disciplinar o paciente. Às vezes, é importantes para o paciente entender o porquê que ele está comendo. Não só o que ele come, mas o como ele come e porquê. Os pensamentos e sentimentos relacionados ao comer influenciam na saúde.


Isso ajuda muito nesse caminho de fazer as pazes com a comida e com o corpo, pois trazemos reflexões de uma desconstrução. Na mentalidade da cultura da dieta, desse fiscal alimentar, a gente vai questionando isso, sempre trabalhando numa abordagem mais compassiva e com um processo de cuidado sustentável.



 

Você pode acompanhar o trabalho da Maiara em suas redes sociais, onde ela posta conteúdos frequentes sobre uma alimentação mais humanizada e intuitiva

Site: https://www.conscienciaintuitiva.com/

Facebook: https://www.facebook.com/nutricionistamaiarafidalgo/

Youtube: https://www.youtube.com/channel/UCF5cPCLTIxwWxdUTWcVJ_Ag

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